Por um placar apertado de votos, as construtoras estão vencendo no Superior Tribunal de Justiça (STJ) a disputa sobre a cobrança de juros em parcelas de imóveis comprados na planta. Os ministros da 2ª Seção retomaram a discussão na semana passada. Por ora, há três votos favoráveis ao pagamento e dois contrários. O relator do caso, ministro Sidnei Beneti, entende que os juros exigidos até a entrega das chaves são abusivos e onerosos ao consumidor.

A decisão final ainda depende de quatro votos. Um eventual entendimento favorável às construtoras significaria uma mudança no comportamento do mercado. Segundo advogados, as empresas vêm firmando Termos de Ajustamento de Conduta (TAC) com o Ministério Público para suspender as cobranças. “Os contratos firmados a partir de 2007 não têm mais essa cláusula”, diz o advogado Marcelo Tapai, do escritório Tapai Advogados.

A discussão sobre a legalidade dos “juros no pé” – como são conhecidos no mercado – chegou à 2ª Seção, responsável por pacificar a jurisprudência em questões de direito privado, em dezembro. Há no STJ pelo menos três decisões sobre o assunto – duas favoráveis às construtoras e uma aos consumidores.

Os primeiros dois votos proferidos na 2ª Seção foram favoráveis aos consumidores. A situação mudou com a retomada do julgamento na semana passada. Ao apresentar seu voto-vista, o ministro Antônio Carlos Ferreira entendeu que há previsão para efetuar a cobrança em uma lei da década de 60, editada para estimular a construção civil (Lei nº 4.864). Considerou ainda que o comprador pode alienar ou vender o imóvel durante a construção. Ele foi acompanhado pelos ministros Raul Araújo e Massami Uyeda. O julgamento foi interrompido por um pedido de vistas do ministro Paulo de Tarso Sanseverino.

De acordo com o advogado Marcelo Tapai, o posicionamento do STJ poderá finalizar também a discussão que trata somente sobre a cobrança dos juros no período entre a obtenção do “habite-se” – documento de conclusão do empreendimento emitido pela prefeitura – e a entrega das chaves. “Tem proprietário que chega a esperar seis meses para entrar no imóvel. A cobrança é ilegal”, diz.

No caso em análise, a construtora Queiroz Galvão questiona, a partir de embargos de divergência, decisão da 4ª Turma que considerou a cobrança de juros “descabida”. A tese que preponderou foi de que, entre a assinatura do contrato de promessa de compra e venda e a entrega das chaves, não há empréstimo ou financiamento da construtora ao consumidor. “Nesse período, não há capital da incorporadora mutuado ao promitente comprador, tampouco utilização do imóvel prometido”, afirma a decisão, de relatoria do ministro Luis Felipe Salomão.

Em um contrato assinado em 2006, a Queiroz Galvão cobrava de uma consumidora juros de 1% ao mês sobre as parcelas de um imóvel comprado por R$ 300 mil em Recife. Em todas as instâncias, a Justiça determinou a revisão do contrato e a devolução em dobro dos valores pagos. De acordo com o advogado da compradora, Thélio Queiroz Farias, do escritório Leidson Farias Advocacia, o valor da restituição seria de aproximadamente R$ 80 mil.

O advogado sustenta que o aumento de gastos com a obra já é compensado com o Índice Nacional de Custo da Construção (INCC). Além disso, uma portaria de 2001 da Secretaria de Direito Econômico do Ministério da Justiça vedou a cobrança. Ele afirma ainda que a Lei nº 4.864, de 1965, teria sido revogada com o Código de Direito do Consumidor, que veda exigir do cliente vantagem manifestamente excessiva. “As incorporadoras só poderiam cobrar juros depois da entrega das chaves. Isso não questionamos”, diz.

A gerente jurídica do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), Maria Elisa Novais, concorda. “É o consumidor que financia a construtora durante a construção. Por que ele tem que pagar juros?”

Além da previsão em lei, o advogado da Queiroz Galvão, André Silveira, do escritório Sergio Bermudes, defende que a cobrança de juros, explicitados em contrato, “gera maior concorrência no mercado e benefícios para quem compra à vista”, afirma. Procurada pelo Valor, a Queiroz Galvão não deu retorno até o fechamento da edição.

Fonte: AASP

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