O juiz Ricardo Cyfer, da 10a Vara Cível do TJRJ, proferiu sentença em 01/8/2020, condenando a Sul America Saúde a dar cobertura a despesas com tratamento de leucemia com o medicamento Venetoclax (Venclexta®), além de obrigar ao pagamento de indenização por danos morais ao segurado que teve a negativa de cobertura.

A autor da ação, cliente da Areal Pires Advogados, ingressou com medida judicial após receber negativa de cobertura do tratamento oncológico com o medicamento Venetoclax (Venclexta®), tendo sido concedida, sem a oitiva da seguradora, antecipação de tutela para obrigá-la a dar cobertura ao medicamento desde o início do processo, evitando que o autor tivesse que esperar o final da tramitação da demanda judicial para obter o bem da vida pleiteado. A tutela inicialmente concedida foi confirmada em sentença de 1o grau, mesmo após a Sul America Saúde apresentar contestação insistindo na legalidade da negativa de cobertura.

A seguradora se negou a dar cobertura medicamento sob a justificativa de inexistência de previsão no rol da ANS.

O magistrado, confirmando a existência relação de consumo, não acolheu os argumentos de defesa apresentados pela seguradora, senão veja-se:

“É assente o entendimento de que o rol da Agência Nacional de Saúde não é exaustivo, comportando interpretação extensiva.

A propósito, súmulas desta Corte:

No. 211 “Havendo divergência entre o seguro saúde contratado e o profissional responsável pelo procedimento cirúrgico, quanto à técnica e ao material a serem empregados, a escolha cabe ao médico incumbido de sua realização”.

No. 340 “Ainda que admitida a possibilidade de o contrato de plano de saúde conter cláusulas limitativas dos direitos do consumidor, revela-se abusiva a que exclui o custeio dos meios e materiais necessários ao melhor desempenho do tratamento da doença coberta pelo plano”.

No. 339 “A recusa indevida ou injustificada, pela operadora de plano de saúde, de autorizar a cobertura financeira de tratamento médico enseja reparação a título de dano moral.

Em recente decisão o STJ pontuou a necessidade de haver registro de medicamentos junto à Anvisa para que possam ser cobertos pelo plano de saúde:

“As operadoras de planos de saúde não estão obrigadas a fornecer medicamento não registrado pela ANVISA” – REsp 1.712.163/SP e 1.726.563/ SP.

No entanto, a negativa de cobertura, in casu, não decorre de falta de registro na ANVISA, e sim do fato de não constar da lista da ANS, o que, como visto, não justifica a recusa do custeio dos insumos requeridos.

Destacamos a jurisprudência consolidada deste tribunal, materializada no verbete 338 da súmula desta Corte, que consiste na premissa de que, se existe cobertura para a doença, não pode haver limitação para os tratamentos a ela relativos, notadamente quando indicados pelo médico assistente.

No. 338, TJ/RJ

“É abusiva a cláusula contratual que exclui tratamento domiciliar quando essencial para garantir a saúde e a vida do segurado”.”

O magistrado prolator da decisão ainda afirma:

“A súmula 211 supratranscrita revela a prevalência que se deve dar à prescrição do médico assistente do consumidor em detrimento da análise técnica do plano de saúde, em caso de divergência, o que se revela em consonância com a interpretação sugerida pelo artigo 47 do CDC.

A despeito da possibilidade de se limitar a cobertura e se garantir o equilíbrio econômico e financeiro do contrato, que deve estar assentado no binômio risco-prêmio, não se pode estender tal limitação a coberturas de materiais ou insumos que são inerentes ao contrato, isto é, a cláusula de exclusão de cobertura não pode ensejar a própria natureza do contrato no que tange ao tratamento com uso de AZACITIDINA e VENETOCLAX

(…)

Alega-se, todavia, que o tratamento pretendido teria caráter experimental e, portanto, vedado pelo artigo 10 da Lei 9.656/98. Essa tese tampouco deve ser acolhida, tendo em vista que a jurisprudência tem se guiado pelo melhor atendimento ao consumidor, isto é, aquele que seja mais moderno e, portanto, dotado de maior potencialidade terapêutica.

Além disso, é importante considerar que o tratamento pretendido é reconhecido pelo CFM como método terapêutico eficaz, corroborando a interpretação que já é favorável ao consumidor.

Importante ressalva, contudo, há de ser observada. O consumidor não tem direito subjetivo à escolha do prestador do serviço médico hospitalar. O equilíbrio econômico e financeiro do contrato deve ser respeitado, razão pela qual cabe à parte ré indicar o prestador relativo ao tratamento indicado pelo médico assistente, notadamente que integre a rede credenciada.”

Destaque-se que o juiz confirma a ocorrência de danos morais gerados pela conduta ilegal da seguradora:

“A negativa de cobertura de medicamento cuja utilização é considerada decisiva para a vida e a saúde da paciente tem o condão de gerar um dissabor que ultrapassa os limites do mero aborrecimento não indenizável, caracterizando-se a lesão moral, cujo montante indenizatório deve, de um lado, evitar o locupletamento indevido, e de outro ressarcir proporcional e razoavelmente o lesado.

A configuração da lesão moral está consolidada na supratranscrita súmula 339, TJ/RJ.

Em relação ao quantum debeatur, Enunciado no 411 da V Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal/STJ:

“O quantum indenizatório fixado a título de danos morais deve observar o critério bifásico. Em um primeiro momento, analisa-se o valor adotado em situações análogas. Após, na segunda fase, verifica- se as questões pertinentes ao caso concreto, como a reprovabilidade da conduta do ofensor, sua capacidade econômica e a extensão do dano sofrido pelo consumidor”.

Pelo exposto, JULGO PROCEDENTE O PEDIDO para CONFIRMAR A DECISÃO de fls. 187 e condenar a parte ré em R$ 5.000,00 (cinco mil reais) por danos morais, acrescidos de juros legais e de atualização monetária a partir desta sentença.”

Destaque-se que a Sul America Saúde não apresentou qualquer recurso da sentença, já tendo cumprido sua condenação de pagamento da indenização e está, até o momento, dando cobertura ao medicamento para o paciente.

Vitória Areal Pires Advogados!

Melissa Areal Pires

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