Texto pela advogada Fabíola Cunha e Carolina Asfora, da Areal Pires Advogados Associados.

Na presente data, comemora-se o Dia Nacional da Luta pela Redução da Mortalidade Materna, destinado à conscientização da população sobre um importante indicador de saúde. A redução da mortalidade materna é tema tão relevante, que foi um dos oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio das Nações Unidas (2000 – 2015) e engloba óbitos causados por problemas relacionados à gravidez ou ao parto ou ocorridos até 42 dias após o procedimento, bem como os decorrentes de abortos, sejam eles naturais ou provocados.

Sabe-se que diversos fatores levam à esta triste realidade. Entretanto, o que mais assusta, é que os principais motivos da mortandade, segundo estudos realizados em mais de 100 países, são doenças facilmente detectadas em exames pré-natais, como diabetes, aids, malária e obesidade, responsáveis por 28% das mortes maternas.

Existem também inúmeras disfunções que podem causar uma morte repentina como a hemorragia grave, hipertensão na gestação, infecções, complicações de abortos e complicações decorrentes de partos cesáreos, uma vez que mulheres submetidas a cesarianas correm 3,5 vezes mais risco de morrer (dados de 1992-2010) e têm cinco vezes mais risco de contrair uma infecção puerperal (dados de 2000-2011).

Entre 1990 e 2015 a redução na taxa de mortalidade materna no Brasil foi de 143 para 62 óbitos maternos por 100 mil nascidos vivos, o que representou uma drástica diminuição de 56%.

Todavia, em que pese esta redução ter sido reconhecida mundialmente, inclusive pela Organização Mundial da Saúde, no ano de 2011, cerca de 54% dos partos realizados no Brasil foram cesarianas, quando a recomendação é de que o total não ultrapasse o percentual de 15%.

Para reduzir a morte materna, o Ministério da Saúde tem implementado políticas para fortalecer a humanização no atendimento das gestantes, a melhoria da atenção pré-natal, nascimento e pós-parto, assim como instituído medidas de orientação e qualificação dos profissionais de saúde, tanto no âmbito da atenção básica como naquele de urgência e emergência.

Sobre este tema, importante introduzir ao debate o uso da expressão “violência obstetrícia”. A Organização Mundial da Saúde (OMS) define-o como “a apropriação do corpo da mulher e dos processos reprodutivos por profissionais de saúde, na forma de um tratamento desumanizado, medicação abusiva ou patologização dos processos naturais, reduzindo a autonomia da paciente e a capacidade de tomar suas próprias decisões livremente sobre seu corpo e sua sexualidade, o que tem consequências negativas em sua qualidade de vida”.

Os principais tipos de violência contra puérperas são o abuso verbal, agressão física e realização de procedimentos sem consentimento da genitora. Entre estes procedimentos inclui-se a episiotomia, comumente utilizado para aumentar o espaço para a passagem do bebê, mas que deve apenas ser adotado em casos específicos.Já o Conselho Federal de Medicina afirma que “A expressão violência obstétrica é uma agressão contra a medicina e especialidade de ginecologia e obstetrícia, contrariando conhecimentos científicos consagrados, reduzindo a segurança e a eficiência de uma boa prática assistencial e ética.”

Ainda, a nova orientação do Ministério da Saúde, de maio de 2019, pede para que o termo seja evitado e, possivelmente, abolido dos documentos que instruem políticas públicas, visto que conota o uso intencional da força e, portanto, não seria aplicável a todos os incidentes que ocorrem durante a gestação, parto ou puerpério.

Ocorre que, o novo entendimento sobre a não utilização do termo “violência obstetrícia” pode criar empecilhos para que se obtenha a reparação na Justiça, uma vez que caindo em desuso, dificultaria o acesso à garantias que a população já possuía.

Alguns países da América do Sul, como, por exemplo Argentina e Venezuela possuem legislações específicas sobre a violência obstétrica, assegurando o direito da mulher à segurança e punição aos profissionais de saúde envolvidos em casos comprovados de violência obstétrica.

Planejamento familiar, acesso a saúde e respeito à saúde da mulher são caminhos que reduzirão a taxa de mortalidade materna, não se admitindo o retrocesso em políticas públicas sobre referido tema.

Dica Cinematográfica: O Renascimento do Parto – longa-metragem “produzido de forma independente por Érica de Paula (roteiro, produção e pesquisa) e Eduardo Chauvet (direção). E o documentário. Nascer no Brasil produzido e dirigido por Bia Fioretti, ilustra a pesquisa Nascer no Brasil, um inquérito nacional sobre parto e nascimento, coordenado pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz). A série é dividida em duas partes, com os temas “Parto, da violência obstétrica às boas práticas” (20 minutos) e “Cesárea, mitos e riscos” (17 minutos).

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