A 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região decidiu negar embargo de declaração apresentado pela Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e de operadoras de planos de saúde e manteve decisão que anula reajustes para pessoas maiores de 60 anos. A decisão vale para todos aqueles cujos contratos não previam esta cláusula. A decisão do TRF-3 vai de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, que julgou inconstitucional reajustes de contratos anteriores à Lei 9.656/98.
Conforme a decisão, que atendeu ação ajuizada pelo Ministério Público Federal em 2002, as operadoras que aplicaram esses aumentos em contratos antigos foram condenadas a devolver o que foi cobrado ilegalmente. As operadoras também terão que pagar uma indenização de R$ 10 mil por dano moral coletivo cada uma. Com base no artigo 35-E da Lei dos Planos de Saúde, a ANS havia autorizado a repactuação de cláusulas de reajustes por faixa etária em contratos firmados dez anos ou mais com segurados maiores de 60 anos.
Opinião, por Renata Medina, advogada da Areal Pires Advogados
A 4ª Turma do Tribunal Regional Federal de 3ª região proferiu recente decisão, fortalecendo mais ainda o entendimento de que é ilegal a aplicação dos reajustes de faixa etária aplicados após o beneficiário atingir 60 anos em plano anteriores a Lei 9.656.
Esse imbróglio vem sendo amplamente discutido nos Tribunais, chegando até aos Tribunais Superiores e tem sido palco constante de diversas ações revisionais e decisões polêmicas.
Pois bem, a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal de 3ª Região ao julgar os embargos de declaração opostos pela ANS entendeu os reajustes de faixa etária efetuados após o segurado completar os seus 60 anos são ilegais, tanto para os planos criados a partir da Lei 9.656 como aos anteriores a ela.
O Tribunal ao proferir esta decisão seguiu a mesma linha já adotada pelo STF que entende ser ilegal o reajuste aplicado após os 60 anos em planos antigos.
Ocorre que devido ao intenso lobby das Seguradoras de Saúde essa questão passou a se tornar cada vez mais problemática, gerando assim grande divergência entre os Tribunais Superiores.
No entendimento do Superior Tribunal de Justiça é proibida a cobrança de valores diferenciados com base em critério etário, pelos operadores de plano de saúde, quando isto caracterizar discriminação ao idoso, ou seja, quando a prática impedir ou dificultar o seu acesso ao direito de contratar por motivo de idade.
No entanto, este mesmo Tribunal acabou citando entendimento de que “a previsão de reajuste de mensalidade de plano de saúde em decorrência da mudança de faixa etária de segurado idoso não configura, por si só, cláusula abusiva, devendo a sua compatibilidade com a boa-fé objetiva e a equidade ser aferida em cada caso concreto” (REsp 866.840).
Por outro lado, temos duas Leis que foram criadas com a finalidade de proteger os beneficiários, especialmente os idosos, como a Lei da Agência Nacional de Saúde (Lei 9.656) e o Estatuto do Idoso (Lei nº 10.741/03) que prevê a vedação de práticas discriminatórias pelos planos de saúde aos idosos.
Estas regulamentações se tornaram necessárias diante da constatação de abusividade nas cobranças de mensalidades realizadas pelas operadoras dos planos de saúde, para adesão ou permanência de consumidores de terceira idade, especialmente quanto à criação de obstáculos para contratação e de reajustes desproporcionais por mudança de faixa etária.
Assim, de acordo com o artigo 15, § 3º do Estatuto do Idoso: “É vedada a discriminação do idoso nos planos de saúde pela cobrança de valores diferenciados em razão da idade”. É importante esclarecer que se considera idoso aquele que possui 60 anos ou mais.
Diante disso, a Agência Nacional de Saúde Suplementar- ANS, por meio da Resolução Normativa 63/63, regulamentou novas faixas etárias para reajustes de mensalidades, limitando a última aos 59 anos de idade.
Dessa forma, as operadoras passaram a ser impedidas de realizarem reajustes de mensalidade por faixa etária de usuários com 60 anos ou mais.
Assim, até que o usuário complete a idade de 59 anos, é cabível o reajuste por faixa etária, com a finalidade de garantir o equilíbrio entre o valor pago e o uso feito pelo consumidor.
Porém caso a operadora realize este aumento de mensalidade em decorrência da faixa etária após essa idade, tal majoração é ilícita, passível de questionamento judicial.
Nesse mesmo sentido, afim de prestar proteção aos usuários dos planos de saúde, a Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ), decidiu no REsp nº 1568244, que: “O reajuste de mensalidade de plano de saúde individual ou familiar fundado na mudança de faixa etária do beneficiário é válido desde que (i) haja previsão contratual, (ii) sejam observadas as normas expedidas pelos órgãos governamentais reguladores e (iii) não sejam aplicados percentuais desarrazoados ou aleatórios que, concretamente e sem base atuarial idônea, onerem excessivamente o consumidor ou discriminem o idoso.”
Vale lembrar que desde que o Estatuto do Idoso entrou em vigor estabeleceu-se uma controvérsia quanto a sua aplicabilidade, no sentido de que se ele pode ser aplicado aos contratos assinados antes de sua entrada em vigor, ou somente para os contratos que forem assinados depois de 1º de janeiro de 2004.
Evidente que a melhor interpretação e o correto entendimento da legislação leva ao entendimento de que as disposições do Estatuto do Idoso são aplicáveis a todos os contratos, sendo, portanto, indiferente da data de sua assinatura.
A legislação, por sua vez, assim como a sociedade, tende a evoluir e não faz sentido “prender” o consumidor à legislação do momento da assinatura de um contrato desse tipo, se surge uma legislação posterior, de interesse social. Assim, quando são editadas leis como o Estatuto do Idoso, que são de interesse social, sua aplicação deve ser imediata, incidindo sobre todas as relações que, na execução do contrato de trato sucessivo, acontecerem a partir da edição dessa nova lei.
Desta forma, a proibição de aumento estabelecida no Estatuto do Idoso e os critérios elencados no julgado anteriormente mencionado, valem para todos os contratos, independentemente da data de sua assinatura.
Fonte: Conjur