O Supremo Tribunal Federal (STF) iniciou nesta quarta-feira o julgamento de cinco ações que vão definir se foram constitucionais os planos econômicos das décadas de 1980 e 1990. A expectativa do presidente da Corte, ministro Joaquim Barbosa, é de que a discussão demande pelo menos quatro sessões plenárias. Os ministros decidiram que vão ouvir os relatórios sobre os processos, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, o advogado-geral da União, Luís Inácio Adams, os advogados inscritos para fazer sustentação oral. Os votos dos ministros serão proferidos apenas em 2014.
Perguntado se o prazo daria mais fôlego para que o governo possa elaborar melhor sua argumentação, o procurador-geral do Banco Central, Isaac Ferreira, evitou comentar a decisão. Disse apenas que a autoridade monetária acatará a decisão.
– O Banco Central tem, independentemente do prazo, uma convicção firme, do ponto de vista constitucional, em relação ao que significam os planos monetários. Portanto, esse é um tempo que se destina aos ministros da Suprema Corte.
Adams afirmou que a decisão do Supremo de iniciar o julgamento sem conclui-lo este ano pode acabar prejudicando a qualidade dos debates.
– Eu não vejo nenhum problema (em começar o julgamento agora), mas eu preferia que o processo de debates que se travam nesse momento fosse mais próximo da decisão. Esse distanciamento, em algum nível, dilui, prejudica a qualidade dos debates – disse Adams.
O ministro destacou que o julgamento está sendo acompanhado de perto pelo mercado e tem repercussões sobre ele:
– Ponderamos com o STF se isso ia gerar alguma sensação de instabilidade. O governo está preocupado com a estabilidade econômica. Vocês mesmos viram que abriu o julgamento, caiu a bolsa, subiu a bolsa. O mercado está muito atento a essas questões. Estamos próximos a ter avaliação de rating em relação ao Brasil, em relação ao sistema financeiro.
Ele acrescentou, no entanto, o mais importante para o governo é que o tribunal reconheça a constitucionalidade dos planos:
– O principal para nós é obter a confirmação do poder do Estado de controlar sua moeda para fins de estabilidade econômica e de combate à inflação – disse Adams.
No início da sessão, o ministro Marco Aurélio Mello propôs o adiamento da discussão para o ano que vem, devido à proximidade das férias do Judiciário, que vão de 20 de dezembro até 3 de fevereiro de 2014. Para ele, interromper o julgamento no meio causaria prejuízo, dada a complexidade do assunto. Outros ministros queriam começar o julgamento imediatamente e interromper na data de início do recesso forense, se fosse o caso, para retomá-lo em 2014. Venceu a proposta intermediária de realizar apenas a primeira fase do julgamento em 2013 e deixar o voto dos ministros para o início do próximo ano.
– Temos em pauta processos de repercussão maior, processos envolvendo valores muito caros para, não digo o governo, mas para o próprio país. A tradição do tribunal sempre se revelou no sentido de não se ter-se, ao término do ano judiciário, a abordagem de temas mais complexos. Sou testemunha deste fato nos 23 anos de integração do colegiado. Proponho que não julguemos esses processos que estão pautados no dia de hoje. É ideal que não haja cisão entre as sustentações orais e a revelação da compreensão sobre a matéria (os votos dos ministros) – disse Marco Aurélio.
O ministro esclareceu que estaria pronto para votar, se fosse necessário. No entanto, o momento era de cansaço entre os ministros para resolver assunto tão complicado:
– Todos sabem que não fujo do trabalho. Estaria, de qualquer forma, habilitado a me pronunciar sobre o tema de fundo. Mas somos humanos e chegamos ao fim do ano judiciário exauridos de nossas forças.
Barbosa ponderou que a data do julgamento foi anunciada com antecedência, mas não veria problema em adiar. O presidente ressaltou que há repercussão geral no caso – ou seja, todos os juízes e tribunais brasileiros ficarão obrigados a repetir a mesma decisão a ser tomada no STF em processos semelhantes. Mais de 400 mil ações desse tipo estão paralisadas em todo o país aguardando a decisão da Corte.
– Há uma expectativa gigantesca em relação às instancias inferiores com relação a esses processos, em função da repercussão geral. Há milhares de processos retidos na origem à espera dessa decisão – lembrou o presidente.
Marco Aurélio argumentou que os processos que aguardam julgamento foram propostos há 20 anos. E não teria problema na espera de mais dois meses. O ministro Gilmar Mendes, relator de um dos processos em pauta, concordou com Marco Aurélio.
– Pela possibilidade de ter interrupção do julgamento, podemos começar logo no início do fevereiro – afirmou Mendes.
O mais antigo integrante da Corte, Celso de Mello, sugeriu o início imediato do julgamento, diante da importância da decisão aguardada.
– A questão é delicadíssima, complexa, mas o tribunal já está preparado. Os juízes foram cientificados com razoável antecedência. Deveríamos iniciar e prosseguir o julgamento. Há uma grande expectativa não só social, como governamental, de que essas questões sejam dirimidas pelo STF – avaliou o decano.
O ministro Ricardo Lewandowski, relator de uma das ações pautadas, alertou para o perigo de uma votação dividida por mais de um mês. Para ele, um placar inclinado para um dos lados da disputa poderia criar falsas expectativas no mercado.
– Vamos ouvir as sustentações orais e interromper, dado o risco de não podermos concluir o julgamento. Continuamos em fevereiro. A interrupção poderia gerar expectativas equivocadas para o sistema financeiro – avisou.
Para tentar conter a inflação, o governo federal editou nos anos 1980 e 1990 planos que alteraram o cálculo da correção dos saldos de poupança. São eles: planos Bresser (1987), Verão (1989), Collor I (1990) e Collor II (1991). Poupadores entraram na justiça com ações individuais para questionar as novas formas de cálculo. Também houve ações coletivas de entidades como o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec).
Um dos relatores do processo, o ministro Ricardo Lewandowski comentou que o caso merece uma rápida resposta do Supremo. Acrescentou que, devido à indefinição, foi criada uma indústria de ações.
– Há um vasto noticiário sobre o caso e grande expectativa – afirmou.
Dos onze ministros, há possibilidade de dois não participarem do julgamento: Luís Roberto Barroso e Luiz Fux. Eles podem se declarar impedidos. Barroso, porque já advogou para a causa antes de ser ministro do STF. Fux, porque a filha dele é advogada de um dos escritórios contratados para atuar no caso. Para completar as ausências, o ministro Teori Zavascki não deve estar presente na sessão de quinta-feira, porque tem outro compromisso. Na próxima semana, Barbosa e Dias Toffoli estarão fora do tribunal.
Segundo o governo federal, uma decisão em benefício dos poupadores causaria prejuízo aos bancos da ordem de R$ 150 bilhões em valores atualizados. Ainda segundo cálculos do governo, retração no crédito chegaria a R$ 1,3 trilhão. O advogado Luiz Fernando Pereira, que representará parte dos poupadores no julgamento do STF, contestou os números do governo. Segundo o advogado, o prejuízo alcançaria cerca de R$ 8 bilhões.
A decisão será tomada no julgamento de cinco ações. Uma delas é de autoria da Confederação Nacional do Sistema Financeiro (Consif). Há também quatro recursos de bancos contra decisões de outros tribunais favoráveis aos poupadores. Dois recursos são de autoria do Banco do Brasil, um do Itaú e um do Santander.
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