Em 1o. de março último nos deparamos com excelente artigo, publicado no site do Conjur, escrito pela renomada jurista e advogada Dra. Cláudia Lima Marques, intitulado “Novas regras para o distrato de contratos de imóveis na planta”.
Inicialmente, tal título nos levou a crer que já teríamos novas regras deflagradas, as quais, como bem escrito pela autora, aniquilariam os direitos os direitos dos consumidores. Felizmente, ao prosseguirmos com a leitura, entendemos melhor qual a visão e proposta do artigo.
Do ponto de vista jurídico e legal, perfeitas as considerações, sobretudo quando levamos em consideração que a Constituição Federal de 1988 garante direitos sociais básicos a todos os cidadãos.
Já do ponto de vista de mercado, há que se agregar sob quais circunstâncias se deu a judicialização de inúmeras demandas que visam o distrato e/ou a rescisão de tantos negócios jurídicos realizados.
Com certeza, somos da opinião que a crise que assola o país é um dos grandes motivadores de grande parte das ações judiciais que visam o distrato ou a rescisão de contratos de imóveis na planta, isto é, o superendividamento do consumidor-adquirente certamente é um dos grandes vilões desta situação. No entanto este não é o único fator!
Quem acompanha o mercado imobiliário de lançamentos de empreendimentos na planta pôde constatar que, na última década, houve um superaquecimento do mercado. O Brasil, em larga escala, nunca viu tantos imóveis serem construídos como na última década. Diante deste cenário, o mercado produtor de insumos também não conseguiu acompanhar a demanda, tampouco tivemos mão de obra especializada para suprir todas as construções em curso no país. Tal realidade trouxe outra consequência drástica: o atraso na entregue do tão sonhado imóvel adquirido. Portanto, outra grande parcela das demandas judicializadas se deram não pelo superendividamento do consumidor, mas sim pela falta de pontualidade na entrega do bem adquirido, mesmo sendo admitido o atraso, visto como carência, de 180 (cento e oitenta) dias.
Como bem destaca a ilustre professora Cláudia Lima Marques, o entendimento do judiciário é uníssono, sobretudo sumulado no tocante às condições de devolução em caso de distrato, tanto através de súmulas regionais, vide a Súmula 98 do TJRJ, assim como dos tribunais superiores, vide a Súmula 543 do STJ. A jurisprudência também é clara no tocante às retenções admitidas para se evitar o enriquecimento ilícito dos incorporadores e construtores. Mas ainda assim, esteja o adquirente superendividado ou esteja o incorporador inadimplente com a entrega do bem adquirido, buscar o distrato ou rescisão de um contrato de um imóvel na planta fora dos tribunais do país é impossível.
Não há que se olvidar que tais compromissos de promessas de compra e venda de bem imóvel na planta são, primeiramente, contratos de adesão. Portanto, aplicar o princípio do pacta sunt servanda seria, no mínimo, grande covardia para a parte que tem “o braço mais forte” na relação jurídica. Infelizmente, é isto, de fato, que acontece, pois o incorporador, em primeiro lugar, não teme a judicialização. Já o consumidor-adquirente, nem sempre tem condições de buscar seus direitos através de uma ação judicial, e acaba, por sua vez, tendo que amargar o prejuízo de um contrato com cláusulas abusivas.
Desta mesma forma, o consumidor não tem força para demonstrar, politicamente falando, que eventual medida provisória traria malefício não só para o superendividado, mas para todos. Já os grandes incorporadores não carecem de recursos financeiros para buscarem seus resultados através de grandes lobbies.
É público e notório que os grandes incorporadores e construtores no país são responsáveis por gerarem milhares de postos de trabalho, assim como o recolhimento de tributos, mas não sejamos ingênuos à ponto de não querermos enxergar que também realizaram, durante mais de uma década, lucros estratosféricos com seus empreendimentos.
Portanto, como sabiamente concluiu a ilustre jurista Dra. Claudia Lima Marques: “Sob um alarde de crise, os direitos dos consumidores, de ordem pública e função social, não podem ser simplesmente aniquilados, diminuídos sem qualquer discussão na seara política.” E complementamos, tal discussão deve também levar em conta os grandes momentos e grandes lucros realizados por mais de uma década pelos grandes incorporadores.
Por Alex Strotbek Consultor da Areal Pires Advogados.