A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu que é de três anos o prazo prescricional aplicável à pretensão indenizatória do segurado contra o segurador, em razão da não renovação de contrato, após sucessivas renovações automáticas. Com esse entendimento, a Turma proveu recurso de um grupo de segurados contra uma seguradora.

Seguindo o voto da relatora, ministra Nancy Andrighi, o colegiado afastou a ocorrência da prescrição de um ano e determinou o retorno dos autos ao Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), para que prossiga no julgamento do mérito do recurso interposto pelos segurados.

Segundo Nancy Andrighi, “tendo em vista a interpretação de caráter restritivo que deve ser feita acerca das normas que tratam de prescrição, dentre as quais está a do artigo 206, parágrafo 1°, inciso II, do Código Civil de 2002 (CC/02), não é possível ampliar sua abrangência, de modo a abarcar outras pretensões, ainda que relacionadas, indiretamente, ao contrato de seguro”.

A decisão da Terceira Turma foi unânime. Mesmo assim, a relatora ressaltou que a Quarta Turma do STJ, por maioria de votos, já aplicou entendimento diverso, considerando o prazo prescricional de um ano em caso análogo. Inclusive, a seguradora já opôs embargos de divergência que, se admitidos, serão analisados pela Segunda Seção, que reúne os ministros das duas Turmas do STJ encarregadas de direito privado.

Reparação pelos danos

Os segurados ajuizaram ação de reparação pelos danos sofridos em decorrência da negativa da seguradora em renovar o contrato de seguro de vida em grupo, após mais de 30 anos de renovações automáticas.

Em primeira instância, o pedido foi negado ao fundamento de ser inadmissível a prorrogação forçada do contrato até a ocorrência de evento futuro e incerto, sob pena de descaracterização da álea (risco de prejuízo) inerente ao contrato de seguro.

No julgamento da apelação, o TJSP reconheceu que após 30 anos de renovação automática do contrato, a seguradora não pode negar sua renovação sem justificativa técnica plausível, de modo a demonstrar a impossibilidade da manutenção do contrato, sob pena de afronta aos princípios do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

Contudo, a apelação foi desprovida porque a corte estadual reconheceu a prescrição do direito dos autores, que seria de um ano a contar da extinção da apólice. Para o TJSP, não há como superar ocorrência da prescrição diante dos termos do artigo 206, parágrafo 1°, do Código Civil.

“Os autores admitem que, em abril de 2005, foram notificados pela seguradora que a partir de 1º de maio de 2005 a apólice estaria extinta, e é a partir desse termo a quo que se conta o prazo ânuo, não havendo notícia de causa suspensiva ou interruptiva da prescrição”, afirmou o TJSP.

Renovação de contrato

Inconformados, eles recorreram ao STJ sustentando que não se aplica à hipótese o prazo de prescrição anual, pois a pretensão não é de recebimento de indenização objeto do contrato de seguro. A pretensão é de caráter pessoal, decorrente da não renovação do contrato após mais de 30 anos de renovação automática e, portanto, o prazo prescricional seria de dez anos.

Os segurados argumentaram que a não renovação do contrato colocaria o consumidor em extrema desvantagem, além de violar os princípios da boa-fé contratual, transparência, respeito à dignidade e proteção dos interesses econômicos do consumidor.

Prescrição

Ao analisar a questão, a ministra Nancy Andrighi destacou que o STJ já se manifestou em diversas oportunidades sobre a prescrição em contratos de seguro. Em algumas delas, inclusive, já foi afastado o prazo prescricional anual do artigo 206, parágrafo 1°, inciso II, do CC/02.

Ao editar a Súmula 101, o STJ fixou a tese de que “a ação de indenização do segurado em grupo contra a seguradora prescreve em um ano”. Contudo, essa orientação jurisprudencial também está relacionada às hipóteses em que a pretensão do segurado refere-se diretamente às obrigações previstas no contrato de seguro.

“É importante observar, da leitura do artigo 206, parágrafo 1°, inciso II, do CC/02, que, quando a lei fixa os termos iniciais dos prazos de prescrição, deixa evidenciado que a pretensão do segurado – ou do segurador – deve estar relacionada ao próprio objeto do contrato de seguro”, destacou a ministra.

Pretensão diversa

Todavia, no caso julgado, a pretensão dos segurados não era o recebimento da indenização securitária contratada, mas a reparação pelos danos sofridos em decorrência da não renovação do contrato de seguro de vida, aplicando-se, por conseguinte, o prazo de prescrição trienal do artigo 206, parágrafo 3º, V, do CC/02.

Segundo Nancy Andrighi, a causa de pedir da indenização é a responsabilidade extracontratual da seguradora, decorrente de alegado abuso e ilicitude da sua conduta de não renovar o contrato sem justificativa plausível, em prejuízo dos consumidores.

“Nesse contexto, esta Corte já reconheceu ser abusiva a negativa de renovação de contrato de seguro de vida, mantido sem modificações ao longo dos anos, por ofensa aos princípios da boa-fé objetiva, da cooperação, da confiança e da lealdade, orientadores da interpretação dos contratos que regulam as relações de consumo”, afirmou.

 

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