Aprovação é derrota para base governista, que atuou no colegiado contra o projeto; o colegiado rejeitou todos os destaques apresentado
A comissão especial da Câmara aprovou nesta terça-feira a proposta que libera o cultivo da maconha (cannabis sativa) para uso medicinal e industrial. A aprovação, após vários adiamentos, é uma derrota para a base governista, que atuou no colegiado contra o projeto. Com 17 votos favoráveis e 17 contrários, o desempate na votação do texto principal coube ao relator, deputado Luciano Ducci (PSB-PR).
A proposta tramita em caráter conclusivo e, com a aprovação, poderia ser enviada diretamente ao Senado para votação, mas os deputados governistas informaram que vão apresentar recurso para levar a análise para o plenário da Câmara.
Após a aprovação do texto principal, o colegiado rejeitou todos os destaques (propostas de alterações) apresentados.
— Esse relatório não foi construído da minha cabeça, não foi uma coisa que peguei e resolvi fazer. Foi discutido como muita gente — disse o relator, citando a colaboração da Agência Nacional de Vigilância (Anvisa), do Ministério da Agricultura, da indústria farmacêutica e das associações de pacientes de cannabis.
— É um projeto seguro, realista, que não trata do uso recreativo – garantiu Ducci.
De acordo com o relatório, “farmácias vivas” do SUS, que já fazem o cultivo de plantas medicinais, poderão também plantar maconha e fabricar produtos à base de canabidiol. Essas farmácias funcionam como opções terapêuticas aos pacientes do SUS.
O substitutivo aponta uma série de definições para garantir a segurança do processo. O plantio industrial deve ser feito por pessoas jurídicas com autorização da Anvisa, no caso se uso medicinal. Já para uso industrial ou veterinário, a autorização deverá ser dada pelo Ministério da Agricultura.
A base governista tentou adiar mais uma vez a votação mais foi derrotada na sessão. Com a colegiado dividido, o desempate, desta vez, foi feito pelo presidente da comissão especial, deputado Paulo Teixeira (PT-SP). Na sessão, Teixeira informou que foi procurado para tentativa de um acordo com os parlamentares contrários à proposta, mas que não houve consenso.
— Se Vossas Excelências quiserem esse acordo votem favorável a parte medicinal — disse Teixeira.
— Nos dá uma semana para gente tentar chegar a um acordo. Nós estamos vivendo em momento crítico em meio à pandemia (..) É infantil. Vamos legalizar o plantio e a oferta em grande escala de maconha. Estamos com desculpa de proteger algumas crianças que tem convulsão legalizando o consumo de drogas no Brasil — rebateu o deputado Osmar Terra (MDB-RS), que é crítico da proposta.
Bolsonaro disse que vetará projeto
O presidente Jair Bolsonaro declarou que pretende vetar o projeto caso seja aprovado. No último mês houve a troca de parlamentares para fortalecer a ala contrária ao projeto na comissão.
O texto teve como base o projeto do deputado Fábio Mitidieri (PSD-SE), de 2015. Inicialmente, ele alterava a Lei Antidrogas apenas para autorizar no Brasil a venda de medicamentos oriundos da cannabis sativa. O relator apresentou um substitutivo amplo, que prevê o uso medicinal, veterinário, científico e industrial. Mitidieri defendeu a proposta mais ampla:
— Vejo muita gente falando de marco legal da maconha. Tem que ter fumado muita maconha estragada para confundir cânhamo com maconha pois nós estamos falando de coisas bem diferentes. O que nós estamos fazendo neste projeto é salvando vidas – disse Mitidieri.
Logo em seguida, o deputado Otoni de Paula (PSC-RJ), que é contrário à proposta, questionou:
— O relator e quem é a favor do projeto como está fumaram maconha enquanto estavam elaborando o mesmo? Porque maconha eu nunca fumei, estragada eu nem sei o que é. Só estou devolvendo a indagação: ou alguém fumou estragada ou alguém fumou a boa – retrucou Otoni de Paula.
O deputado pastor Eurico (Patritoas-PE), que em sessão anterior chamou deputados de “maconheiros”, também voltou a alfinetar os colegas que defendiam o relatório. Já Diego Garcia (Podemos -PR) criticou alterações feitas pelo relator no projeto que, segundo ele, deveria ser apenas para liberação do plantio para uso medicinal.
— Concentramos o debate no uso medicinal, mas não teve nenhum parlamentar defendendo e explicando qual é o produto de beleza importante para que justifique a aprovação deste relatório que não trata mais do uso medicinal, mas que cria o marco da machona no Brasil — afirmou Garcia.
O deputado Alex Manente (Cidadania- SP) defendeu o relatório apresentado por Ducci afirmando que o debate foi amplo. A comissão especial realizou no ano passado 12 audiências púbicas. Manente afirmou que é necessário baratear a medicação para quem precisa da cannabis e criticou notícias falsas divulgadas sobre o projeto.
No final da audiência, o deputado Ricardo Izar ( PP-SP) que deu um depoimento pessoal na semana passada sobre sua luta contra doença Parkinson, fez um apelo aos parlamentares.
— Gostaria de fazer um apelo aos que são contra ao projeto que deixem suas crenças de lado, que deixem o egoísmo de lado e que proporcionem esperança aos pacientes que tem Parkinson, que tem Alzheimer, tantas outras doenças degenerativas, que repensem, que no plenário mudem de posição — disse.
Em dezembro de 2019 a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) autorizou a venda em farmácias de produtos à base de cannabis para uso medicinal no Brasil. Mas o cultivo de maconha segue proibido e, para a fabricação, é preciso importar o extrato da planta.
Fonte: O Globo