A decisão permite também a concessão de remédios sem registro na Anvisa, mas a necessidade deve ser avaliada caso a caso
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quarta-feira que os medicamentos de alto custo para o tratamento de doenças raras devem ser fornecidos pelo Estado. Para os remédios que ainda não têm registro na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a concessão deve ser feita com base na análise da real necessidade de cada caso, com observância de pré-requisitos estabelecidos, como comprovação da incapacidade de arcar com os custos da medicação.
“O Estado só pagará se o medicamento for registrado na Anvisa. Excepcionalmente, medicamentos para doenças raras poderão, sob certas condições, solicitar importação mesmo não tendo registro na Anvisa”, explicou Salmo Raskin, geneticista do Departamento Científico de Genética da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). PUBLICIDADE
A votação continua durante a tarde para definir o que fazer em casos de medicamentos aprovados pela Anvisa, mas não analisados ou não aprovados pela Conitec, a Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS, cuja função é avaliar tecnologias em saúde e recomendar a sua incorporação ao sistema público.
O processo, que começou em 2016, havia sido adiado por causa do pedido de vista do então ministro Teori Zavascki. De acordo com o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), mais de 40.000 ações aguardavam uma posição definitiva da Justiça sobre a questão.
Na pauta estavam processos que tratavam da responsabilidade solidária dos entes federados na prestação dos serviços de saúde (RE 855178), além da obrigação do Estado de fornecer remédios considerados de alto custo (RE 566471) e não registrados na Agência Nacional de Vigilância Sanitária (RE 657718).
O que há no SUS
Atualmente, o SUS disponibiliza medicamentos para doença de Gaucher, osteogênese imperfeita e atrofia muscular espinhal (AME) – essa última incorporada no mês passado. Com a decisão do STF, outras medicações devem ser concedidos pelo Estado para pacientes com diversas formas de doença rara – desde que haja comprovação da necessidade.
Em 2014, o Ministério da Saúde tinha estabelecido a Portaria nº 199, que instituiu a Política Nacional de Atenção Integral às Pessoas com Doenças Raras. Entre as medidas elencadas, constam diretrizes para atenção integral dos pacientes por meio do SUS e a constituição de incentivos financeiros de custeio. No entanto, pouco tem sido feito para avançar na implementação. Por causa disso, especialistas defendiam a posição de que o governo brasileiro deveria fornecer esses medicamentos aos pacientes com indicação.
A determinação do STF é celebrada por especialistas. “Isso é, sem dúvidas, muito importante para o Brasil. O país começou a falar sobre doenças raras. [O termo] entrou no dicionário”, comentou Raskin.Veja também
As discussões
Durante as discussões, a avaliação predominante dos ministros era de que a ausência de registro da Anvisa proibiria – como regra geral – o fornecimento de medicamento de alto custo. Atualmente, o Estado pode ser obrigado a fornecer medicações não registradas (desde que tenham comprovação de eficácia e segurança) somente na hipótese de longa demora da Anvisa em apreciar o pedido de registro (prazo superior a 365 dias), quando preenchidos três requisitos: 1) a existência de pedido de registro do medicamento no Brasil; 2) a existência de registro do medicamento em renomadas agências de regulação no exterior; e 3) a inexistência de substituto terapêutico com registro no Brasil.
No entanto, os ministros entenderam que é possível (em caráter excepcional) justificar a concessão do remédio, desde que preenchidos certos pré-requisitos. “A regra é que é indispensável o registro da Anvisa. Mas em hipóteses excepcionais se permite que caso a caso, eventualmente se chegue à conclusão diversa”, frisou a ministra Rosa Weber.
O ministro Alexandre de Moraes acrescentou que o fornecimento do medicamento deveria ser autorizado pela Justiça mediante preenchimento de requisitos, como o paciente comprovar que não tem condições de pagá-lo e a apresentação de um laudo médico. Já o ministro Ricardo Lewandowski defendeu a tese de que a medicação só deveria ser fornecida quando a família, e não apenas o paciente, não pode custear o tratamento. Para ele, a Justiça só poderia autorizar o tratamento com a “comprovação robusta da necessidade” do medicamento, a indicação de inexistência de tratamento oferecido no âmbito do SUS e a apresentação de um atestado de eficácia do remédio.
Fonte: Veja