Já foi decidido pelo STF que o recebimento de remédios “é direito fundamental, podendo o requerente pleiteá-los de qualquer um dos entes federativos, desde que demonstrada sua necessidade e a impossibilidade de custeá-los com recursos próprios” (Recurso Extraordinário 607.381).
Instado a fornecer tal direito, o estado de Santa Catarina interpôs recurso em ação que o compeliu para tanto alegando que, devido à solidariedade da obrigação, seria totalmente viável o chamamento da União para a demanda sobre o fornecimento de medicamentos.
Entretanto, a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que, embora haja solidariedade entre os entes federativos quanto ao fornecimento de medicamentos, uma vez proposta ação nesse sentido contra determinado estado, não cabe o chamamento da União ao processo com base no artigo 77, inciso III, do Código de Processo Civil (CPC). Em decisão unânime, os ministros concordaram que seria “inadequado opor obstáculo à garantia fundamental do cidadão à saúde”.
Solidariedade
É sabido, entretanto, que, em havendo solidariedade passiva, é facultado ao réu o chamamento ao processo dos outros devedores solidários, de acordo com o art. 77, III, do CPC. Sendo assim, concluir-se-ia que, de acordo com a regra, clara, disposta no Código de Processo Civil, que seria justo e viável ao ente federativo chamar à lide aquele sobre a qual não foi interposta ação, porém recai a obrigação de fazer pleiteada. Isso se dá, de acordo com Fredie Didier Jr., porque
“sua finalidade primeira é alargar o campo de defesa dos fiadores e dos devedores solidários, possibilitando-lhes, diretamente no processo em que um ou alguns deles forem demandados, chamar o responsável principal, ou os co-responsáveis ou coobrigados, para que assumam a posição de litisconsorte, ficando submetidos à coisa julgada”¹.
Entretanto, a Primeira Seção do STJ, ao julga recurso especial do estado de Santa Catarina, entendeu pela não aplicabilidade do artigo 77, mesmo este sendo preceito válido e perfeitamente aplicável nas situações com tal enquadramento. Isto seu deu pela análise da questão sob outro espectro: o litisconsórcio em questão trata-se de modalidade facultativa (posto não se enquadrar no art. 47 do CPC), o que permite que seja aplicado o disposto no artigo 46 do mesmo Código de Processo Civil, a saber:
“Art. 46. Duas ou mais pessoas podem litigar, no mesmo processo, em conjunto, ativa ou passivamente, quando:
[…]
Parágrafo único. O juiz poderá limitar o litisconsórcio facultativo quanto ao número de litigantes, quando este comprometer a rápida solução do litígio ou dificultar a defesa. O pedido de limitação interrompe o prazo para resposta, que recomeça da intimação da decisão.” (grifos nossos)
Ou seja: em que pese o Código de Processo Civil possibilitar ao réu, devedor solidário, chamar à lide os outros coobrigados, este também traz em seu bojo outro dispositivo que protege, por assim dizer, o credor, quando possibilita ao juiz limitar o chamamento ao processo, sobretudo quando entende estar o devedor solidário – que é responsável pela satisfação do todo independente de haver outro devedor em conjunto – utilizando a lei como supedâneo para furtar-se de seu dever.
Desta forma, mais do que acertada a decisão do STJ, quando o estado é capaz de arcar com a responsabilidade, não sendo necessário o chamamento da União para a satisfação da pretensão buscada frente a parte passiva legítima.
Tatyana Patricia Lima Rodrigues Chagas
Advogada Associada ao Escritório Areal Pires Advogados Associados.
¹DIDIER JR., Fredie. Curso de direito processual civil: Introdução ao Direito Processual Civil e Processo de Conhecimento. Vol 1, 14ª ed. rev., ampl. e atual. Salvador: Ed. Juspodivm, 2012, p. 405.