Com reajustes sistematicamente acima da inflação nos últimos anos, os planos de saúde vêm se tornando inviáveis para grande parte dos brasileiros. Uma pesquisa realizada pelo Datafolha, em parceria com o Instituto de Estudos de Saúde Suplementar (IESS), mostra que os convênios têm virado quase um artigo de luxo: entre os que conseguem pagar pelo atendimento, a maioria tem renda superior a três salários mínimos e pertence, no mínimo, à classe B.

A pesquisa leva em consideração apenas os planos médico-hospitalares — um universo de 44 milhões de beneficiários — e desconsidera os exclusivamente odontológicos. As pessoas que não têm o serviço contratado culpam os preços altos. Para 77%, o valor das mensalidades vai além do que o orçamento permite. No entanto, mais de 70% valorizam e gostariam de ter acesso ao serviço. Além disso, o levantamento mostra que, para os entrevistados, de forma geral, os convênios aparecem em terceiro lugar na lista de prioridades, atrás apenas de educação e casa própria.

Com renda familiar de R$ 3,2 mil, o motoboy Márcio Barbosa, 30 anos, lamenta não ter condições de pagar pela assistência médica suplementar. “Em minha casa, moram seis pessoas e só eu e meu pai trabalhamos”, disse. Com quase R$ 1,9 mil absorvidos por aluguel, água, luz e prestação do carro, não sobra muito para outras despesas. “Cada um ajuda com o que pode, mas não dá para gastar muito além do básico”, queixou-se.

No entanto, Márcio e os irmãos começam a se preocupar em garantir atendimento ao pai, que está com 60 anos. “Por enquanto, ele não apresenta muitos problemas de saúde. Nunca se sabe quando ele pode entrar em uma fase mais apertada”, considerou. “Mas as mensalidades são muito caras. Vamos pesquisar bem e contratar algum com o melhor custo-benefício.”

Aumentos

Segundo a pesquisa, 43% das pessoas que não estão ligadas a nenhuma operadora já possuíram plano de saúde, mas deixaram de pagar pelo serviço. As administradoras culpam o aumento dos custos médicos pelas mensalidades caras, e temem que a escalada dos preços leve uma parcela ainda maior dos conveniados a abandonar os contratos. O presidente da Associação Brasileira de Medicina de Grupo (Abramge), Arlindo de Almeida, chegou a afirmar que “vai haver uma dissociação muito grande entre o que a pessoa recebe e o que precisa pagar para ter um convênio, e, em algum momento, ela pode não ter mais condições de custear o plano”.

Segundo o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), em três décadas, as mensalidades devem aumentar, em média 163,5% acima da inflação, caso o setor siga o mesmo comportamento dos últimos 10 anos. Com isso, o comprometimento da renda dos beneficiários cresceria 66%.

A estudante Josilene Pereira de Oliveira, 30 anos, teve plano de saúde por dois anos enquanto trabalhou como repositora em um hipermercado, até oito anos atrás. “Depois disso, não consegui mais pagar. Na minha idade, faz falta”, considerou. A renda da casa, de R$ 1,2 mil, vem do pai, vendedor autônomo.

Sem assistência, Josilene encontra na fé e em medicinas alternativas a forma de driblar os problemas de saúde. “Rezo bastante e dou meu jeito. Quando tenho inchaço nas pernas, tomo suco de abacaxi”, contou ela, que sofre de cálculo renal. “Encomendei algumas ervas para fazer um chá de quebra pedra. Não encontro tratamento para isso na rede pública, e, na particular, vai custar muito”, avaliou.

A estudante afirmou que é sempre franca quando precisa consultar um médico. “Digo que não tenho como pagar remédios caros. Peço para eles receitarem os que cabem no orçamento de casa, ou que eu possa buscar em postos de saúde.”

Josilene também se preocupa com o pai, de 53 anos, que passou recentemente por uma cirurgia para retirar nódulos do pescoço. “Ele deve ficar 15 dias de repouso. Temos que contar com a sorte, porque pagar por esse período no hospital, comprometeria 50% da renda da casa”, comentou. Ela disse que chegou a procurar um plano, mas desistiu. “O mais barato que encontrei custa R$ 280 por mês, o que, para mim, ainda é caro. Não oferecem desconto para autônomos”, reclamou.

Custos

A Federação Nacional de Saúde Suplementar (Fenasaúde) afirmou, em nota, que, de fato, “quanto mais alta a renda da população, maior a adesão ao item plano de saúde”, mas observou que as classes B e C, “vêm registrando maior adesão” aos convênios. A federação argumentou ainda que o valor da mensalidade “deve refletir os custos assistenciais do setor, de modo a garantir o equilíbrio econômico dos contratos”.

 

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