Devedores estão conseguindo na Justiça impedir a penhora de imóveis comerciais. Decisões das esferas estadual e trabalhista têm negado pedidos de bloqueio, desde que seja o único bem do proprietário e o valor do aluguel, utilizado para sua subsistência.
As decisões vão além do que estabelece a Lei nº 8.009, de 1990, que trata da impenhorabilidade do bem de família. Em agosto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já havia ampliado essa proteção, por meio da edição da Súmula nº 486. O texto diz que imóvel residencial não pode ser penhorado, ainda que esteja alugado para terceiro. Deve-se comprovar, porém, que o valor da locação é destinado ao sustento da família.
Essa prova também está sendo levada a casos envolvendo imóveis comerciais. A tese foi aceita recentemente pela 67ª Vara do Trabalho de São Paulo. A devedora argumentou que o aluguel do seu imóvel comercial, no valor de R$ 2.750, representaria 65% da sua renda atual. Alegou ainda ter elevados gastos com tratamento de saúde que, só no ano passado, consumiu R$ 12 mil.
Para comprovar a situação de sua cliente, a advogada Danielle Pereira Silva, do escritório Barros Ribeiro Advogados, afirma ter apresentado declaração de Imposto de Renda para demonstrar no processo que ela não tem nenhum imóvel residencial em seu nome e que o aluguel do espaço comercial seria essencial para sua sobrevivência.
Na decisão, a juíza Renata Mendes Cardoso entendeu que o aluguel do imóvel comercial “contribui substancialmente para seu sustento”. Segundo ela, não é “finalidade da execução promover o estado de miserabilidade do devedor, retirando-lhe a condição de prover a própria subsistência”. A decisão ainda cita acórdão do Tribunal de Justiça do Distrito Federal (TJ-DF) nesse mesmo sentido.
Para Danielle, a decisão ampliou ainda mais o que dispõe a súmula do STJ e estaria em consonância com a intenção expressa na Lei nº 8.009, de 1990, de proteger a unidade familiar.
No Rio Grande do Sul, a 17ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça (TJ-RS) também decidiu a favor de uma proprietária de um imóvel comercial alugado que sofria uma execução judicial ajuizada por um banco. Os desembargadores impediram a penhora do imóvel por considerá-lo como único bem de família e sua única fonte de renda e sustento. A decisão foi unânime.
De acordo com o advogado Ricardo Trotta, do Ricardo Trotta Sociedade de Advogados, essas decisões resgatam a intenção do legislador de garantir a subsistência da família. Ele atuou em um processo em que o magistrado encontrou um meio termo. No caso, o devedor aluga sua garagem para fins comerciais.
O juiz Henrique Vergueiro Loureiro, da 1ª Vara Cível do Foro Regional do Tatuapé, em São Paulo, determinou a penhora de 30% do valor do aluguel, no caso de R$ 200. Os valores deveriam ser transferidos mensalmente ao credor, até a quitação da dívida, de cerca de R$ 9 mil.
Para o advogado João Gilberto Goulart, titular do Goulart & Colepicolo Advogados, o raciocínio válido para o imóvel residencial deve ser aplicado também para o comercial. “A destinação do imóvel é irrelevante para fins de proteção. O importante é que se preserve a subsistência do núcleo familiar com a impenhorabilidade do único bem”, afirma.
Mesmo o devedor que reside em imóvel comercial tem conseguido impedir a penhora na Justiça. Foi o que ocorreu em um caso analisado pelo STJ. O relator, ministro Luiz Fux, atualmente no Supremo Tribunal Federal (STF), observou que o uso da sede da empresa como moradia da família ficou comprovado, o que exigia do Judiciário uma posição “humanizada”. Para o ministro, expropriar aquele imóvel significaria o mesmo que alienar o bem de família. “A lei deve ser aplicada tendo em vista os fins sociais a que ela se destina”, diz na decisão.
Adriana Aguiar – De São Paulo
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