Se constatado que a compra de um imóvel foi feita com o objetivo de ocultação e blindagem de patrimônio — mesmo que a aquisição tenha sido feita antes da propositura de eventuais ações trabalhistas —, o bem em questão pode ser penhorado, ainda que seja a única residência do demandado.
Com esse entendimento, a 12ª Turma do Tribunal da 2ª Região manteve a penhora sobre um bem avaliado em cerca de R$ 4,5 milhões adquirido pelo executado principal antes das reclamações trabalhistas. O colegiado interpretou que esse devedor, antevendo problemas financeiros, comprou o imóvel para, de forma fraudulenta, enquadrá-lo como bem de família.
Na primeira instância, o juiz Richard Wilson Jamberg entendeu que, no caso, era notória a prática de blindagem patrimonial, ação ilícita com vistas a ocultar patrimônio, que ocorreu antes do surgimento de dívidas, tratando-se de operação complexa com aparência de legalidade. “Não é por outra razão que o artigo 169 do Código Civil prevê que a simulação não convalesce com o tempo, podendo ser declarada a qualquer momento”, afirmou.
No TRT-2, o juiz-relator Flávio Laet corroborou essa interpretação. A intenção de fraudar futuras execuções fica mais evidente, segundo ele, quando se avalia o fato de que o bem foi colocado em nome da filha, que ainda era menor de idade no tempo da aquisição, com instituição de usufruto em favor do pai executado. “Resta evidente que o intuito ali foi apenas a ocultação e a blindagem patrimonial de futuras execuções”, disse.
Dada a evidência da fraude, o magistrado reforçou o não reconhecimento da propriedade como bem de família a aplicou ao caso a previsão do artigo 4º da Lei 8.009 de 1990, segundo o qual “não se beneficiará do disposto nesta lei aquele que, sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga”.
Reforma trabalhista
Segundo o acórdão, a reforma trabalhista, apesar de determinar a prévia instauração do incidente de desconsideração da personalidade jurídica (IDPJ) para a inclusão dos sócios no polo passivo da demanda, “em nenhum momento altera a roupagem de direito material que rege a matéria”. “Ou seja, a lei nova apenas cria um incidente processual, no resguardo do devido processo legal, visando o contraditório substancial, mas nada versando sobre os elementos ensejadores da responsabilização dos devedores secundários pelos débitos trabalhistas”.
SOS Execução
O julgado do TRT-2 é o primeiro processo do programa “SOS Execução”, iniciativa da Corregedoria Regional do tribunal para trazer melhorias à fase de execução. O caso chegou à segunda instância por meio de um pedido de cooperação da 2ª Vara de Cotia (SP) para a reunião de execuções em face de um devedor comum em mais de 30 ações. O programa promoveu a reunião solicitada, criou comissão de credores e fez várias pesquisas avançadas por meio de ferramentas eletrônicas.
O trabalho permitiu o bloqueio de patrimônio com o objetivo de honrar dívidas trabalhistas, inclusive do imóvel de mais de R$ 4,5 milhões. Atualmente, a execução já engloba 168 processos, com valor superior a R$ 17 milhões.
Decisão
1000867-15.2021.5.02.0242
Fonte: ConJur