O presente texto tem por finalidade apresentar os números da judicialização da saúde no Brasil entre 1º de janeiro e 31 de dezembro de 2020.

Resumidamente, tramitou no Poder Judiciário em 2020 a quantidade de 339.964 demandas judiciais sobre saúde[1].

A primeira característica a destacar é o impacto da pandemia (iniciada em março de 2020), que ensejou a sensível redução global dos números de processos sobre saúde no país (em 2019 foram 459.076 demandas[2], ao passo que em 2020 esse número foi de 339.964).

A tabela a seguir exemplifica o cenário:

AssuntoQuantidade 
Saúde (direito administrativo e outras matérias de direito público)41.106
Fornecimento de medicamentos – SUS72.770
Tratamento médico-hospitalar – SUS29.021
Tratamento médico-hospitalar e/ou fornecimento de medicamentos[3] – SUS31.952
Assistência à Saúde/servidor público36.088
Assistência médico-hospitalar (militar)8.586
Ressarcimento ao SUS697
Direito da saúde pública (ressarcimento)[4]735
Reajuste da tabela do SUS298
Convênio médico com o SUS430
Direito da saúde (convênio médico com o SUS)[5]580
Repasse de verbas do SUS144
Direito da saúde (repasse de verbas do SUS)[6]318
Terceirização do SUS1.751
Saúde suplementar[7]21.881
Planos de saúde (direito do consumidor)71.114
Serviços hospitalares – Consumidor/plano de saúde12.331
Plano de saúde (direito do trabalho)13.694
Taxa de saúde suplementar (tributário)471
Doação e transplante órgãos/tecidos266
Direito administrativo (doação e transplantes de órgãos)1.469
Saúde mental (direito administrativo)2.321
Controle social e Conselhos de saúde2.901
Hospitais e outras unidades de saúde6.596
Erro médico36.619
Tratamento da própria saúde (servidor público)4.974
Direito da saúde[8]1.855
Direito da saúde pública (SUS)[9]2.996
TOTAL339.964

Outras observações que merecem destaque:

a) sensível redução do número de processos envolvendo a saúde pública (o assunto fornecimento de medicamentos, por exemplo, apareceu 72.770 vezes em 2020, com 129.674 ocorrências em 2019);

b) de outro lado, chama atenção o aumento do volume de processos sobre erro médico: subiu de 31.039 demandas em 2019 para 36.619 processos em 2020;

c) a redução global do número de processos indica uma possível demanda reprimida que ensejará nova escalada da judicialização nos próximos anos.

Sobre a metodologia adotada nesta análise, é importante destacar que são somados todos os processos ajuizados no primeiro grau, nos juizados especiais, os recursos interpostos nos tribunais (TJs e TRFs), nas turmas recursais, nas turmas regionais de uniformização e no Superior Tribunal de Justiça (STJ). A fonte de consulta é a base de dados eletrônica[10] do Relatório Justiça em Números do Conselho Nacional de Justiça 2021.

Os efeitos da pandemia ficaram marcados nos novos números da judicialização da saúde e certamente afetarão os próximos anos, pois poderão causar: a) aumento de pedidos de indenização por danos ocorridos em razão da Covid-19; b) menor autocontenção dos magistrados (em razão da Recomendação 66 do CNJ)[11].

Por fim, é necessário maior empenho dos gestores em saúde (pública e suplementar) para aumentar a qualidade dos serviços prestados e, principalmente, reduzir os efeitos da pandemia e minimizar o impacto da judicialização.


[1] Os critérios foram definidos pelo autor a partir dos assuntos indicados na tabela.

[2] SCHULZE, Clenio Jair. Judicialização da saúde em números. Jota. 03 Nov. 2020. Disponível em: https://www.jota.info/opiniao-e-analise/artigos/judicializacao-da-saude-em-numeros-03112020. Acesso em 11 Nov. 2021.

[3] O Relatório prevê o cadastramento separado dos assuntos “Fornecimento de medicamentos” e “Tratamento médico-hospitalar” ou em conjunto (“Tratamento médico hospitalar e/ou fornecimento de medicamentos”), por isso foram somadas todas as hipóteses.

[4] Direito da saúde pública (ressarcimento) é uma categoria nova, incluída na pesquisa de 2021 (inexistente nos anos anteriores).

[5] Direito da saúde (convênio médico com o SUS) é uma categoria nova, incluída na pesquisa de 2021 (inexistente nos anos anteriores).

[6] Direito da saúde (repasse de verbas do SUS) é uma categoria nova, incluída na pesquisa de 2021 (inexistente nos anos anteriores).

[7] Saúde suplementar é uma categoria nova, incluída na pesquisa de 2021 (inexistente nos anos anteriores).

[8] Direito da Saúde é uma categoria nova, incluída na pesquisa de 2021 (inexistente nos anos anteriores).

[9] Direito da Saúde pública (SUS) é uma categoria nova, incluída na pesquisa de 2021 (inexistente nos anos anteriores).

[10]  Disponível em: https://paineis.cnj.jus.br. Acesso em 11 Nov. 2021.

[11] BRASIL. Conselho Nacional de Justiça. Recomendação Nº 66 de 13/05/2020. Recomenda aos Juízos com competência para o julgamento das ações que versem sobre o direito à saúde a adoção de medidas para garantir os melhores resultados à sociedade durante o período excepcional da pandemia da Covid-19. Disponível em: https://atos.cnj.jus.br/atos/detalhar/3318. Acesso em: 11 Nov. 2021.

CLENIO JAIR SCHULZE – Doutor e Mestre em Ciência Jurídica (Univali). Pós-graduado em Justiça Constitucional pela Universidade de Pisa (Itália). Autor do livro “Judicialização da Saúde no Século XXI” (2018) e coautor do livro “Direito à Saúde” (2019, 2ª edição). Juiz federal

Fonte: Jota

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