É justo que contrato seja mais oneroso ao fiador, do que ao locatário?

 

Nos contratos de locação de imóvel, seja para fim comercial ou residencial, o locador precisa de garantia quanto ao efetivo cumprimento do contrato. Apesar de haver diversas formas de garantia, como depósito prévio de alguns meses de aluguel ou seguro-fiança junto a instituições financeiras, de natureza de caução, a garantia mais requisitada pelos locadores é a presença de fiador.

E não é difícil imaginar a razão do descontentamento dos locadores com as demais formas de garantia, já que, no caso de inadimplemento do contrato de locação, até que se faça possível o despejo do locatário, e a imissão na posse pelo locador, por via judicial, o valor depositado, já há muito não satisfaz seu crédito.

Para prestação de garantia por fiador, em regra, são apresentados os seguintes documentos:

– certidão de nascimento ou casamento, se houver;
– RG e CPF do fiador e de seu cônjuge, se houver;
– comprovante de rendimento;
– escritura definitiva e registrada de imóvel de sua propriedade, situado na mesma comarca do locador, para maior praticidade, em caso de execução;
– certidão de ônus reais atualizada da matrícula do imóvel dado como fiança;
– certidões dos cartórios de protesto;
– certidões dos distribuidores (cível, criminal e fiscal)

Restando verificada a existência de imóvel de propriedade do fiador, com a concordância expressa do cônjuge e, diante da verificação de ausência de demandas judiciais que ponham em risco a propriedade do imóvel, e confirmem sua idoneidade, encontra-se o fiador apto a participar do contrato de locação, na qualidade de garantidor, com a necessária anuência expressa do cônjuge.

É essencial que se verifique que, no caso de o fiador ser casado pelo regime de comunhão total ou separação parcial de bens, necessariamente o cônjuge deverá anuir o contrato, com sua assinatura, para fins de evitar futura arguição de nulidade da garantia.

Esta preparação, que antecede a elaboração do contrato, é de suma importância, para que o cumprimento do contrato de locação transcorra normalmente, minimizando as chances de prejuízos ao locador, motivo pelo qual é recomendável que se busque o auxílio de escritório de advocacia especializado nesta área, para análise de perfil de locador e fiador, e elaboração de contrato.

Há casos em que, apesar de todo o cuidado tido na fase pré-contratual, o contrato é descumprido pelo locatário. É neste momento que se torna essencial a figura do fiador, garantidor do contrato.

Isto porque, em casos de necessidade de ajuizamento de ação de despejo em face do locatário e de cobrança de aluguéis, é possível que se execute o valor devido somente em face do fiador, ainda que este somente possua um único bem de família.

Mesmo com o advento da Emenda Constitucional n. 26/2000, que reitera o direito constitucional à moradia , o entendimento jurisprudencial ainda garante eficácia ao artigo 3o, da Lei n. 8009/90, incluído posteriormente pela Lei n. 8245/91, que retira a garantia de impenhorabilidade de bens decorrente da prestação de fiança em contrato de locação.
Ou seja, o fiador, que presta garantia de forma gratuita, é mais prejudicado, em caso de inadimplemento contratual, do que o próprio locatário, causador do débito.

E melhor sorte não possui o fiador, em caso de execução dos valores judicialmente, já que a execução pode ser movida somente em face do fiador, sem litisconsórcio necessário com o locatário.

Apesar do forte entendimento jurisprudencial no sentido de determinar a possibilidade de penhora do único bem de família do fiador, a discussão ainda se encontra aberta acerca da violação do direito constitucional à moradia deste.

Ainda que se entenda que o fiador prestou garantia, consciente de que seria seu único bem de família, não se pode onerá-lo em demasia, deixando de lhe garantir o direito à moradia, prevista constitucionalmente.

Compartilha deste mesmo entendimento o Exmo. Ministro aposentado do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, Dr. Aldir Passarinho Junior que, em julgamento memorável de que foi relator, nos autos do Recurso Especial n. 1.105.725 , acompanhado por unanimidade pela Colenda Quarta Turma, em 22/06/2010, proferiu brilhante decisão, se remetendo a julgados que confirmam a indivisibilidade do bem, e sua integral impenhorabilidade, sem mesmo a possibilidade de resguardar a terceiro sua parcela no fruto da venda em hasta pública do imóvel, sob pena de desaparecimento material do lar que abriga a família do devedor.

Esta brilhante decisão, proferida pelo Exmo. Ministro, Dr. Aldir Passarinho Junior, garante o avivamento da discussão sobre a possibilidade de penhora de bens do fiador, relacionada ao direito constitucional de moradia, demonstrando o interesse popular pela regulação da matéria, sem a excessiva oneração do fiador.

Amable Alves Fonseca

Advogada Associada ao Escritório Areal Pires Advogados Associados, Formada em 2008 pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, e Pós-Graduanda em Direito Processual Civil pela Universidade Cândido Mendes


¹ Emenda Constitucional n. 26/2000 – texto extraído do site www.planalto.gov.br, in verbis:
Art. 1º O art. 6º da Constituição Federal passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.” (NR)
² Artigo 3º, da Lei n. 8009/90 – texto extraído do site www.planalto.gov.br, in verbis:
Art. 3º A impenhorabilidade é oponível em qualquer processo de execução civil, fiscal, previdenciária, trabalhista ou de outra natureza, salvo se movido:
VII – por obrigação decorrente de fiança concedida em contrato de locação. (Incluído pela Lei nº 8.245 , de 1991
³ Fonte: Superior Tribunal de Justiça – www.stj.jus.br

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